Folhas Amarelas
Noutro dia estava eu a vasculhar arquivos antigos, textos esquecidos e alguns cujo momento havia deixado minha memória. Deparei-me com um poema do qual não me lembrava, mas, inevitavelmente, era de minha autoria. Agora, de onde vem essa onda de inspiração que gera obras tão belas e até inexplicáveis?
Posso atribuir a fonte à Awen druídica, a origem da inspiração ancestral, o berço da minha crença e cálice do conhecimento de Eras e Eras. Também posso dar o crédito a alguma ligação especial com a natureza, com as pessoas, com os animais, com o local onde vivemos. Sem dúvida, cada razão que vocês possam atribuir à inspiração – independente de credo ou local – faz-se presente num momento de inspiração. Com isso, chego ao ponto vital deste texto: não escrevo há um tempo.
Ou melhor, não escrevo com a mesma freqüência e, acho, qualidade com que os bem acostumei. Pergunto-me: o que aconteceu? Não tenho dúvida de que as razões acima descritas e tantas outras possíveis não se alteraram. A Awen continua acessível, as ligações não mudaram em tão pouco tempo e etc. Depois de pensar alguns dias nesse assunto, mesmo sem intenção de escrever a vocês, notei que – deixando de lado o chavão – a mudança operou-se em mim. E não gostei nada disso. Por sorte, descobri rapidamente o que havia acontecido e, garanto, todo mundo já passou por isso.
Sabe aquela sensação de estar flutuando para chegar num lugar meio incerto, numa hora meio indefinida? Pois é, comecei a dar tanta importância a alguns pontos materiais (relevar todos eles é bobagem e simplesmente impossível, por mais que gurus da auto-ajuda digam o contrário) e encontrei o desânimo no lugar da empolgação quando podia sentar e escrever sobre um daqueles detalhes delicados que observo durante minhas caminhadas.
Era como se a ligação estivesse obstruída, algo assim. Infelizmente, acho que descrever é um difícil já que até isso é incerto. Hoje, ao chegar a estas conclusões e, por fim, decidir sentar para escrever este texto quase desabafo. Lembrei de tantas peculiaridades que poderiam ter gerado poesias, elogios, declarações de amor puro e paixão intensa por pessoas, lugares, momentos ou mesmo simples idéias. Foi nesse momento que senti uma sutil mudança e pronto: tá na hora de acordar.
Outro dia fiquei perdido, devaneando entre folhas e folhas que deixaram a rua com um tom outonal, mesmo que estejamos no nosso inverno. Acho que foi a primeira vez na minha vida que parei para perceber o dia em que as folhas começavam a cair. Algo totalmente mágico, e que também passou desapercebido nesse meu momento desconectado. Sem dúvida, isso ainda vai gerar uma bela poesia para demonstrar o como folhas mortas foram capazes de despertar algo adormecido – não, fora de foco é melhor. A morte traz a vida, ou melhor, ela suscita a nova vida, o renascimento, a novidade.
Tenho certeza de que aquelas folhas mortas tinham uma razão, um motivo para estarem ali, disfarçadas de montes de lixo e um incômodo aos demais transeuntes que as evitavam como se fossem algo asqueroso e nojento. Não dei a mínima, e caminhei justamente entre o longo percurso criado pelas folhas, meio amareladas, bege estalante, verde apagado.
Num outono fora de hora, numa rua fora do mundo, numa mente fora dali. Tudo aconteceu e o mundo presenciou um pouco mais de mágica. Pelo menos o meu mundo.
Bem, meus olhos cansados e meu labirinto surtado dão os sinais para, mais uma vez, parar e deixá-los para, muito em breve, retornar.
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